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Em 1969, quando o astronauta Neil Armstrong tornou-se o primeiro homem a pisar o solo da lua, ele pronunciou a famosa frase: "É um pequeno passo para o homem, mas um gigantesco salto para a humanidade". Não tenho certeza se a fortuna gasta pela NASA, a agência espacial norte-americana, nessa aventura, não teria melhor uso aqui na Terra mesmo, por exemplo, no combate à fome na África. Mas, em plena "Guerra Fria", os motivos geopolíticos eram mais importantes que os motivos humanitários.
Mas, ainda assim, a viagem à lua trouxe contribuições importantes para o avanço da ciência em vários campos, inclusive na medicina. Quero dizer com isso que os gastos em ciência e tecnologia (C&T), embora demorem a dar frutos, não podem ser menosprezados como acontece no Brasil. Os cortes de gastos no orçamento do governo, quase sempre, se dão em investimentos em C&T, enquanto que as demais despesas, inclusive militares, são preservadas. O resultado é esse que estamos vendo no caso das vacinas, onde o país virou refém dos insumos produzidos pela China.
Vale lembrar que China e Índia, os maiores produtores de IFA (sigla que significa Ingrediente Farmacêutico Ativo), assim como o Brasil, Rússia e África do Sul compõem os BRICS - um grupo que reúne as principais economias emergentes. Como a Rússia produz e exporta a sua própria vacina (a Sputnik V), apenas o Brasil e a África do Sul dependem da importação de IFA. Inclusive o Brasil, por não ter comprado antecipadamente as vacinas, num ambiente em que a demanda supera a oferta do produto, irá pagar 2,5 vezes mais que os países europeus pela vacina Oxford/AstraZeneca.
China, Índia e Rússia estão colhendo agora os frutos cujas sementes foram plantadas através de seus investimentos em C&T na área de fármacos. Só o descaso pela C&T explica o motivo pelo qual o Brasil tenha ficado fora desse lucrativo negócio de vacinas, que ora favorece inclusive seus parceiros mais pobres dos BRICS, como é o caso da Índia. Mais grave ainda, sabendo-se que o país possui instituições como o Instituto Butantan, da USP, e a Fiocruz, que são referência mundial no setor de vacinas.
À falta de visão de longo prazo soma-se a inépcia do atual governo na área de saúde. O caos que se verifica atualmente em Manaus, com pessoas morrendo por falta de oxigênio, é o desfecho de uma crise que vitimou dois ministros da Saúde e culminou com a posse de um general no Ministério, supostamente expert em logística. Que logística é essa que já gastou mais de R$ 90 milhões com a compra de medicamentos (cloroquina, azitromicina, tamiflu, etc.) sem eficácia comprovada pela Anvisa, hoje armazenados, e que irão perder a validade? O pior de tudo, ainda, é o Ministério da Saúde recomendar o uso desses medicamentos no seu site (postagem retirada após críticas generalizadas).
Mesmo que o problema da falta de vacinas venha a ser resolvido por pressão da sociedade, ainda tem muito "chão" pela frente. A distribuição da vacina e a sua aplicação, num país de grande população e vasto território, são desafios difíceis de serem vencidos. É fato que a existência do SUS, inexistente na maioria dos países, é um ponto a favor. Mas o sistema também sofre pela falta de verbas e pessoal, o que reduz a sua contribuição. Sem falar nas Fake News que estimulam a população a não tomar a vacina.
Hoje, o retorno da economia à normalidade depende do êxito do Plano Nacional de Vacinação. Resta apenas uma dúvida: será que esse Plano existe de verdade?